Estudo coordenado pela Univates
pode contribuir para desenvolvimento futuro de fármacos para tratar a Covid-19
Uma pesquisa coordenada pela
Universidade do Vale do Taquari - Univates foi
recentemente publicada na revista científica Scientific Reports, um
megajornal científico do grupo Nature. O trabalho, que lança luz sobre mutações
no vírus SARS-CoV-2, é um esforço na tentativa de identificar mecanismos
envolvidos em processos virais que podem contribuir para o desenvolvimento
futuro de fármacos para tratar a Covid-19.
O trabalho liderado pelo professor Luis Fernando Saraiva Macedo Timmers (foto) analisou 627 sequenciamentos genéticos de amostras do SARS-CoV-2 coletadas no
Brasil e identificou 109 mutações no vírus causador da Covid-19. O estudo dá
aos pesquisadores condições de avaliar mecanismos de evolução viral, ou seja,
quais proteínas estão sofrendo mutações e em quais elas são mais prevalentes.
“Podemos ter indícios de como o vírus está se adaptando ao meio”, explica
Timmers.
O estudo é uma visão geral sobre
as mutações que aconteceram no Brasil e, ao estar agora disponível à comunidade
científica internacional, contribui para a adoção de diferentes abordagens
possíveis no campo do desenvolvimento de fármacos para o tratamento da
Covid-19. Devido ao alto índice de transmissibilidade, o Brasil se tornou um
epicentro de Covid-19 no mundo e, desde então, vem sendo monitorado para
entender onde ocorrem as mutações no genoma do SARS-CoV-2 e como essas
variações se disseminam.
“Combinamos análises genômicas e estruturais para avaliar genomas isolados de diferentes
regiões do Brasil e mostrar que as mutações mais prevalentes estavam
localizadas nos genes S, N, ORF3a e ORF6, que estão envolvidos em diferentes
estágios do ciclo de vida viral e sua interação com células hospedeiras”,
descreve o docente. Esses dados mostram como a biologia estrutural, combinada
com a genômica, pode ser aplicada para entender melhor a variabilidade viral e
ser útil em estudos de descoberta de fármacos com base na estrutura e
desenvolvimento de vacinas.
A análise estrutural realizada na
pesquisa evidenciou as posições dessas mutações nas estruturas das proteínas.
“Essas informações podem ajudar a entender o impacto das mutações sobre a
estabilidade das proteínas virais, a eficácia das vacinas e também monitorar o
quão diferentes os vírus são no Brasil quando comparados a outras regiões”,
revela o pesquisador.
Sequência dos estudos
O mundo está numa corrida para
tentar encontrar fármacos desde o começo da pandemia, mesmo que a atenção
internacional tenha se voltado inicialmente para os imunizantes. “A partir do
momento em que a pessoa está doente, também vamos precisar de remédios
eficazes, um tratamento farmacológico”, relata Timmers.
Nessas condições, o estudo tem a
perspectiva de continuar. A doutoranda Débora Bublitz Anton, do Programa de
Pós-Graduação em Biotecnologia (PPGBiotec) da Univates, orientada pelo
professor Timmers e coorientada pela professora Márcia Inês Goettert, está
trabalhando na prospecção de moléculas que possam ser usadas como inibidores
com características antivirais e anti-inflamatórias contra o SARS-CoV-2,
utilizando técnicas de biologia molecular e bioinformática.
“O SARS-CoV-2 apresenta a enzima
3CL protease (3CLpro), a qual é responsável por clivar as poliproteínas
formadas após a tradução do RNA viral, que são essenciais para o seu processo
de replicação. Se impedirmos que essa proteína funcione, o vírus não vai se
formar e replicar”, explica Timmers. Outra possibilidade do estudo é analisar
se existem mutações na proteína 3CLpro, a protease principal do
SARS-CoV-2.
“Se aconteceram mutações nessa
proteína, precisamos levar o fato em consideração, porque os fármacos em estudo
podem interagir de forma diferente com elas”, analisa o pesquisador. “O
interessante de modular a atividade dessa proteína em específico é que ela é
importante para a replicação viral, ou seja, se conseguirmos impedir a
replicação, podemos parar o vírus”. Essa poderia ser uma abordagem para
tratamento farmacológico antiviral para a Covid-19.
O trabalho desenvolvido vai além.
Os pesquisadores da Univates estão na busca por uma molécula que, além de
antiviral, possa ser anti-inflamatória. “Se conseguirmos encontrar uma molécula
que funcione nessas duas áreas, teremos uma vantagem muito grande em relação ao
vírus. Um dos maiores problemas da Covid-19 reside em decidir quando iniciar o
tratamento”, acrescenta Timmers. “Identificar uma molécula antiviral que
auxilie na modulação do processo inflamatório no organismo do hospedeiro seria
muito vantajoso para nós, além de abrir mais uma porta para o desenvolvimento
de fármacos”.
Este é o primeiro trabalho de
Timmers como autor principal publicado em uma revista científica de grande
prestígio internacional. “É uma satisfação constatar o respaldo da comunidade
científica no nosso trabalho, publicado agora na Scientific Reports. O trabalho
colaborativo é essencial para que as pesquisas aconteçam. Não se faz ciência
sozinho. Só podemos entregar um trabalho como esse com colaboração”, explica o
professor.
Time
Além da Univates, participam da
pesquisa a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), a Universidade
Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), a Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e a Universidade
de Tübingen (Alemanha).
O artigo é assinado por Luis
Fernando Saraiva Macedo Timmers, Julia Vasconcellos Peixoto, Rodrigo Gay
Ducati, José Fernando Ruggiero Bachega, Leandro de Mattos Pereira, Rafael
Andrade Caceres, Fernanda Majolo, Guilherme Liberato da Silva, Débora Bublitz Anton,
Odir Antônio Dellagostin, João Antônio Pegas Henriques, Léder Leal Xavier,
Márcia Inês Goettert e Stefan Laufer.
A pesquisa tem fomento do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da
BRF.
Texto: Lucas George Wendt
Imagens:
Professor Luís Fernando Saraiva
Macedo Timmers - Crédito da imagem: Divulgação
Bioinformática - Crédito da
imagem: Divulgação
Coronavírus - Crédito da imagem:
Fusion Medical Animation/Unsplash